quinta-feira, 17 de junho de 2010

Entrevista: Profª Olivette Rufino avalia a importância das escolas na formação da consciência ambiental e quais falhas ainda precisam ser corrigidas

Durante este mês de junho, foram feitas manifestações em Teresina por conta do dia 05 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente. A secretaria municipal do Meio Ambiente (SEMAN) organizou uma caminhada ecológica para encerrar a programação das atividades da Semana do Meio Ambiente. Nesse contexto, entrevistamos a professora Olivette Rufino Prado Aguiar, Doutora em Educação pela UFRN e professora adjunta da Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Tendo como área de interesse a formação e o desenvolvimento de conceitos na perspectiva sócio-histórica, a professora Olivette falou sobre a importância de movimentos ambientais na formação de uma consciência ambiental dos indivíduos. Contudo, ressaltou que é no cotidiano que essas mudanças comportamentais se fazem mais importantes.

Ela acredita que o diálogo entre escola, família e demais instituições sociais são importantes nesse contexto, porém são difíceis e precisam da vontade política da sociedade.


Infocientizando: No início do mês, houve a Caminhada Ecológica em decorrência da Semana do Meio Ambiente. Como a senhora avalia esse tipo de manifestação no momento atual?
Olivette Rufino: Penso que essas manifestações são de extrema relevância, principalmente na atual conjuntura, porque o que a gente está vendo é uma degradação cada vez maior do meio ambiente e isso repercute em diversas catástrofes que retornam como uma fúria da natureza contra as pessoas. Eu louvo essas manifestações porque elas são um veículo também importante para que as pessoas atinjam a conscientização maior acerca dessa necessidade de se proteger o meio ambiente, não agredir, não degradar.

Infocientizando:
Jogar lixo no chão, com a justificativa de que haverá alguém para limpar depois ,não é algo tão incomum de se ver, por exemplo. O que sugere que nem sempre a consciência ambiental está presente no cotidiano das pessoas. Na prática cotidiana, como a senhora percebe que esse movimentos se mostram eficazes?
Olivette Rufino: É complicado. Não é um movimento isolado, anual ou mesmo semestral que vai fazer muita diferença, mas eu penso que se você começa a fazer manifestações desse tipo e cria uma prática cotidiana de encontrar meios de conscientizar cada vez mais as pessoas. Isso com certeza vai resultar numa atuação do ser humano que leve a uma modificação dessa prática [danosa ao meio ambiente]. As escolas vêm trabalhando com as crianças nesse sentido que você falou. O meu neto, por exemplo, de vez em quando me ensina coisas as quais eu não fui ensinada. Estou aprendendo agora, já depois de adulta, o que é muito diferente. O que eu percebo é que tanto a mídia como a escola, constantemente, vêm tratando de assuntos relacionados ao meio ambiente. Acontece que, muitas vezes, o professor está com um conteúdo relacionado a ecologia e, de repente, ele tem uma prática diferente. Entretanto, aluno que aprende aquilo questiona e diz “mas não está certo”.

I: Então, a senhora acredita que é mais fácil para uma criança aprender esses conceitos do que uma pessoa adulta?
O. R.: Não tenha a menor dúvida. É lógico que a nossa maneira de se comportar se modifica. A gente vai mudando ao longo do tempo, mas existem determinadas situações que são marcantes e que levamos para o resto da vida. Então, a insistência nessa preocupação com o meio ambiente, presente na vida das crianças hoje, indica que elas irão aplicar isso na vida adulta. É diferente de nós que não aprendemos e agora temos que assimilar essa coisa nova. É mais difícil para quem é adulto hoje estar internalizando esses conceitos do agir ecologicamente correto do que para as crianças que estão aprendendo isso desde a mais tenra idade. Isso é indiscutível.

I: A senhora acredita que as pessoas hoje estão mais conscientes ou pouco/quase nada é feito na preservação do meio ambiente?

O. R.: Acredito que elas estejam mais conscientes. Até mesmo aquelas pessoas que não têm um grau de instrução muito elevado, porque elas são orientadas pela mídia. O que é que falta mesmo? O que falta é a vontade política de alguns setores da sociedade.

I: Quais?
O. R.: Os grandes empresários. O lucro fala mais do que a consciência ambiental. Infelizmente, estamos inseridos numa sociedade capitalista.

I: Mas, para além dessas questões mais macro, a senhora não acha que pequenas atitudes também são relevantes? Se a consciência ambiental existe no cotidiano das pessoas, é provável que elas se manifestem com mais firmeza diante de abusos cometidos.

O. R.: Com certeza. Pequenas atitudes são essenciais. É a partir delas que conseguimos ampliar isso num leque cada vez maior de ações que resultem na preservação ambiental. A gente ainda vê coisas absurdas como esquinas cheias de lixo no centro da cidade. Você vê pessoas que até têm uma boa condição econômica e social jogarem sacos de lixo numa calçada e numa esquina. Contudo, existem aqueles que estão passando de carro ou de bicicleta que olham e acham um absurda e dizem “ei, aí não é local de jogar lixo!”.

I: Como a senhora relaciona a sua atividade enquanto educadora e a conscientização das pessoas?

O. R.: Aqui na academia formamos professores. Penso que a universidade tem um papel fundamental. A partir do momento também em que recebemos no nosso quadro de professores, profissionais que têm esse tipo de preocupação e que fazem disso uma prática cotidiana, articulando todos os conteúdos que são necessários à formação desses futuros profissionais com as questões ambientais. Temos que estar fazendo essa relação todo o tempo em sala de aula para que os futuros professores que saiam daqui saibam que eles também têm essa responsabilidade para com a formação das crianças que irão frequentar as escolas.

I: Hoje as crianças transitam por diversos espaços que, por si só, já são híbridos. Como articular esses diferentes espaços de modo que elas tenham essa conscientização? Como promover o diálogo entre esses espaços?

O. R.: É uma pergunta difícil e a concretização disso, muito mais. É uma necessidade articular escola e família, já que a escola não educa sozinha.

I: A senhora acredita que hoje existe um diálogo entre escola e família?
O. R.: Não é fácil fazer essa articulação entre escola e família. Uma grande reclamação que a gente vê nas escolas é a ausência dos pais nas reuniões. Muitas vezes, os professores precisam ter esse diálogo com os pais para entender melhor determinada criança e não têm porque eles estão ausentes da escola. Sabemos que isso é necessário. Em resumo: é difícil, mas não é impossível. Agora, se a gente pensar que essa articulação entre escola e família é difícil, e incluir outras instâncias dificulta mais esse diálogo . É preciso que haja vontade política das pessoas.

I: Os pais são mais ausentes nas escolas da rede pública ou privada?
O. R.: Pública. É um problema muito grande. São muitos fatores que influenciam. A própria situação dos pais e dos alunos da escola pública já é um indicador de que é preciso um trabalho muito maior de conscientização. As escolas têm insistido nesse ponto e tem havido melhorias, mas melhorias muito tímidas. Isso desanima.

I: Por que acontece isso na escola pública?
O. R.: O professor geralmente chama o pai na escola quando o aluno vai mal para tentar resolver o problema. Então, o pai vai a primeira vez, a segunda, mas não vai uma terceira vez. Porque ele diz “Eu sou venho aqui para receber reclamação do meu filho?”. Essa é uma das razões. Então, é necessário que a escola crie estratégias que sejam mais eficazes.

I: Quais, por exemplo?

O. R.: Por exemplo, chamar o pai para dizer que o filho está muito bem, que está ótimo. E não apenas quando filho está com problemas.

I: Cite outras, por favor.
O. R.: Sabemos que o conhecimento é o que leva as pessoas a alcançarem um nível maior de conscientização. Então, como os pais da rede pública geralmente têm um grau de escolarização inferior, eles não entendem essa necessidade que a escola tem de ter o contato com a família da criança. Não sei te dizer a receita, mas é preciso que a escola encontre uma forma de trazer o pai para a escola ,para que ele desperte essa conscientização. Agora é muito complicado porque é grande a quantidade de fatores negativos que influenciam nessa postura de ausência. A desestruturação familiar, por exemplo.

I: O que a senhora considera uma família desestruturada?

O. R.: Há mais desentendimentos familiares quando inexiste a condição de manter uma vida digna, uma boa alimentação, enfim, uma condição humana que não resulte em tantos problemas socioeconômicos. Isso não é o único fator. Há o problema do uso de diferentes tipos de drogas, sejam elas lícitas, no caso do álcool, ou ilícitas. Isso também traz problemas de relacionamento tanto entre pais como dos pais em relação aos filhos. Esse é um problema muito recorrente nas famílias que moram em periferias, por exemplo. Sabemos que é muito ruim para os pais, mas é bem pior para a criança que está crescendo naquele ambiente e que quando ela chega na escola, não sabe lidar com determinadas situações e vai repetir aquilo que ele viu na casa dele ou na vizinhança. Então, não estou dizendo que todos esses problemas serão resolvidos com a articulação entre escola e família. Esse é apenas um ponto de partida para que tenhamos uma outra situação.




Reportagem: Cássia Sousa e Ludmila Barbosa
Edição: Tamires Coelho

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